Tenho o olhar
enevoado, os pensamentos ainda nem são, repousam nas mantas, pingam incertos,
miúdos, como as gotas de orvalho na janela.
Não me falem,
segredem-me e só se for preciso!...
Não estraguem esta brandura!
O cão poupado, bem
sabe: apena pisca os olhos, estendido diante da vidraça do corredor. É
deferente, tem vagar! Afinal, quanto menos alarido, maior a economia e a
poesia! Quem diria... Dispensa-se mais filosofia.
Abro a janela,
miro o Leste lusco-fusco, arejo o quarto com Janeiro. O céu cinzento é raiado
dos ramos despidos da nogueira, as faias altaneiras talvez varram as nuvens....
Oxalá, não demais, não vá o sol radioso insultar a neblina!
O ar frio
atravessa a roupa. Lá fora faz inverno, piam os corvos; se fosse na costa, eram
gaivotas...
Sem grande
destino, rojo os pezinhos de lã pelo crepúsculo da casa, sorvendo lentamente o
café da chávena almoçadeira. Lá saio para o terraço, tiro a temperatura ao dia,
trago um golo de vento, mirando uma rosa que floresce agora!
Recolho à
brancura matinal da sala, onde ainda perdura, viçoso, o abeto tardiamente
erguido; e fica. Em Janeiro, também é Natal!... Não enquanto os homens quiserem
– sabe-se lá, quem eles são... – é Natal porque nestas manhãs – nossas - renascem
laços ocultos e perpétuos que atravessam terras, oceanos, até aos confins do
mundo!
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Morgengrauen, em alemão, traduz-se por alvorada.... Literalmente,
porém, quer dizer “cinzento matinal” e esta pequena diferença é essencial porque
subtrai o sol português, compreensivelmente implícito na palavra “alvorada” e
em todos os seus sinónimos (amanhecer, alba, alvor, etc.). Afinal, sem sol também há dia. A língua ideal é composta
de muitos idiomas.